Alterações na tributação da renda das pessoas físicas a partir de 2026: inconstitucionalidades do projeto de lei

Por ACI: 26/03/2025

Há muito tempo, formou-se um consenso acerca da incompatibilidade jurídica do limite de isenção do Imposto de Renda das Pessoas Físicas com a ordem jurídica constitucional. Para além do referido limite, a não correção da tabela do imposto de renda, respectivamente aplicável, tem implicado a tributação não da efetiva renda (constitucionalmente definida como acréscimo patrimonial), mas sim de valores necessários à sobrevivência do cidadão. Isso vem dando ensejo a inaceitável tributação do denominado mínimo-existencial e, por decorrência, implica direta afronta ao princípio basilar que sustenta o Estado Democrático de Direito brasileiro: dignidade da pessoa humana. 

De uma forma ainda tímida, o limite de isenção foi elevado para dois salários-mínimos a partir de 2023, aplicando-se uma “engenhosa” fórmula, a qual evita que essa desoneração repercuta em relação rendimentos superiores, como se alguém que tivesse renda de R$ 3 mil a R$ 4 mil mensais pudesse acumular riqueza, nos dias em que vivemos. Já Havia, portanto, uma mácula ao princípio norteador do imposto de renda: a progressividade tributária. Isso ocorre, desde então, porque os contribuintes enquadrados nas demais faixas de incidência não têm o direito a usufruir igualitariamente do limite de isenção.

Recentemente, o governo anunciou o envio para o Congresso Nacional de projeto de lei visando, na prática, majorar o limite de isenção para todos aqueles que têm renda inferior a R$ 5 mil, além de permitir um desconto extra do imposto para aqueles cuja renda ultrapasse a esse valor e não exceda a R$ 7 mil. Ou seja, na prática amplia-se a aplicabilidade da fórmula que permite a isenção até dois salários-mínimos. 

Obviamente, a ampliação do limite de isenção representa uma correção de histórica injustiça fiscal, que se desvelava na medida que se constata um crescente descompasso entre o valor da renda beneficiada com a isenção, comparativamente ao índice de inflação oficial: IPCA. Ora, se o limite de isenção existente quando do advento do Plano Real fosse apenas atualizado pelo referido índice de inflação, este hoje chegaria a mais de R$ 7 mil. Nesse ponto, incontestável o projeto.

Porém, pretende-se discutir aqui outros dois pontos significativos do projeto: a) a não correção das demais faixas de rendimentos e; b) a instituição de um (novo) imposto sobre as rendas altas. Ou seja, a partir de um olhar exclusivamente jurídico, pode-se questionar se a não utilização dos mesmos critérios de atualização da tabela constitui afronta ao princípio da progressividade tributária do imposto de renda, bem como se instituição de uma denominada sistemática de tributação mínima da renda, da forma como proposta, está de acordo com a constituição brasileira.    

Há muito tempo, formou-se um consenso acerca da incompatibilidade jurídica do limite de isenção do Imposto de Renda das Pessoas Físicas com a ordem jurídica constitucional. Para além do referido limite, a não correção da tabela do imposto de renda, respectivamente aplicável, tem implicado a tributação não da efetiva renda (constitucionalmente definida como acréscimo patrimonial), mas sim de valores necessários à sobrevivência do cidadão. Isso vem dando ensejo a inaceitável tributação do denominado mínimo-existencial e, por decorrência, implica direta afronta ao princípio basilar que sustenta o Estado Democrático de Direito brasileiro: dignidade da pessoa humana.  

De uma forma ainda tímida, o limite de isenção foi elevado para dois salários-mínimos a partir de 2023, aplicando-se uma “engenhosa” fórmula, a qual evita que essa desoneração repercuta em relação rendimentos superiores, como se alguém que tivesse renda de R$ 3 mil a R$ 4 mil mensais pudesse acumular riqueza, nos dias em que vivemos. Já Havia, portanto, uma mácula ao princípio norteador do imposto de renda: a progressividade tributária. Isso ocorre, desde então, porque os contribuintes enquadrados nas demais faixas de incidência não têm o direito a usufruir igualitariamente do limite de isenção.

Recentemente, o governo anunciou o envio para o Congresso Nacional de projeto de lei visando, na prática, majorar o limite de isenção para todos aqueles que têm renda inferior a R$ 5 mil, além de permitir um desconto extra do imposto para aqueles cuja renda ultrapasse a esse valor e não exceda a R$ 7 mil. Ou seja, na prática amplia-se a aplicabilidade da fórmula que permite a isenção até dois salários-mínimos.  

Obviamente, a ampliação do limite de isenção representa uma correção de histórica injustiça fiscal, que se desvelava na medida que se constata um crescente descompasso entre o valor da renda beneficiada com a isenção, comparativamente ao índice de inflação oficial: IPCA. Ora, se o limite de isenção existente quando do advento do Plano Real fosse apenas atualizado pelo referido índice de inflação, este hoje chegaria a mais de sete mil reais. Nesse ponto, incontestável o projeto. 

Porém, pretende-se discutir aqui outros dois pontos significativos do projeto: a) a não correção das demais faixas de rendimentos e; b) a instituição de um (novo) imposto sobre as rendas altas. Ou seja, a partir de um olhar exclusivamente jurídico, pode-se questionar se a não utilização dos mesmos critérios de atualização da tabela constitui afronta ao princípio da progressividade tributária do imposto de renda, bem como se instituição de uma denominada sistemática de tributação mínima da renda, da forma como proposta, está de acordo com a constituição brasileira.    

Sabe-se, pois, que o art. 153, par. 2º, inc. I da Constituição determina que o imposto de renda seja progressivo, isto é, que suas alíquotas sejam maiores à medida que a base de cálculo (renda) assim o seja. Para evitar afronta ao princípio da igualdade/isonomia a técnica da progressividade aplicável é a complexa, ou seja, as alíquotas são iguais para todas as faixas de rendimentos. Com isso, independentemente da renda total auferida, todos os contribuintes têm direito a uma parcela igual de isenção, bem como a uma igualitária submissão as suas alíquotas intermediárias. Nisso, pois, consiste a regra constitucional da progressividade do imposto de renda! Uma vez que o projeto apenas eleva a faixa de isenção, sem estendê-la para as demais, resta inescapável a afronta ao princípio que alicerça o imposto de renda das pessoas físicas: progressividade. Ora, quem auferir renda um pouco superior a R$ 7 mil mensais, pagará imposto substancialmente maior do que aquele que recebe entre R$ 5 mil (totalmente isento), ou ainda, do que aquele que percebe mensalmente acima do limite de isenção até R$ 6,9 mil. Nesse ponto, constata-se uma clara inconstitucionalidade do projeto. 

Em relação à nova tributação das altas rendas, percebe-se também a mácula da inconstitucionalidade do projeto. A sistemática de tributação, delineada pelo art. 6º - A e seguintes do projeto, que institui o que vem sendo denominado “imposto de renda mínimo”, o qual incide sobre a totalidade dos rendimentos, representa uma inédita forma de tributação da renda no Brasil. Isso ocorre, porque os elementos da hipótese de incidência são distintos daqueles ora vigentes.  Dessa forma, tem-se, de fato, um novo imposto sendo instituído, com contribuintes, alíquotas, bases de cálculo indiscutivelmente inéditos.  Não se ignora, pois, que a Constituição permite a instituição de novos impostos, nos termos do art. 154, inc. I. No entanto, ela requer que o instrumento normativo utilizado seja o da lei complementar (maioria absoluta), além de o novo imposto no ter fato gerador e base de cálculo de outros já existentes. Portanto, nesse ponto também, o projeto contém o vício da inconstitucionalidade. 

Enfim, sem adentrar em outros aspectos que refogem à abordagem estritamente jurídica, como, por exemplo, a redução significativa na arrecadação de Estados e municípios, em face a ampliação do limite de isenção do imposto que por ora incide na fonte, há de se reiterar que o grande mérito do projeto reside na correção de uma histórica inconstitucionalidade perfectibilizada na tributação do denominado mínimo existencial como se renda fosse. Não obstante, isso não pode estar condicionado ao cometimento de outras máculas constitucionais, que ampliariam a rechaçável insegurança jurídica. 

Marciano Buffon
Consultor tributário e fiscal e integrante do Comitê Jurídico da ACI-NH/CB/EV/DI
Buffon & Furlan Advogados Associados

 

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