Convênio ICMS nº 109/2024 e seus reflexos na legislação do RS: indevida inclusão do diferimento do ICMS no regime optativo
Por ACI: 14/01/2025
Publicado no Diário Oficial da União no dia 07 de outubro de 2024, o Convênio ICMS nº 109/2024 disciplinou as regras para as remessas interestaduais de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade[1]. Para fins de manter a conformidade com o que fora decidido pelo Supremo Tribunal Federal – STF, quando do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49, ficou entabulado no referido convênio que as transferências interestaduais de mercadorias realizadas entre estabelecimentos da mesma empresa passariam a ser, obrigatoriamente, desoneradas da incidência do ICMS.
Como consequência disso, após cada operação de transferência de mercadorias, com a não incidência do ICMS, o contribuinte deveria realizar a transferência do imposto que incidiria sobre referida operação ao estabelecimento destinatário.
No intuito de “facilitar” aos contribuintes o controle de tais operações, foi determinada a emissão de uma nota fiscal para transferir mercadorias – com a não incidência do ICMS - e de mais uma nota fiscal para transferir o ICMS incidente sobre a mercadoria transferida. Para tanto, foi acrescentada no texto do convênio em questão a previsão que segue:
Cláusula sexta - Alternativamente ao disposto nas cláusulas primeira à quarta, por opção do contribuinte, a transferência da mercadoria poderá ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador de imposto, para todos os fins.
§ 1º Na hipótese desta cláusula, considera-se valor da operação para determinação da base de cálculo do imposto:
I - o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;
II - o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento;
III – tratando-se de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de sua produção, assim entendidos os gastos com insumos, mão-de-obra e acondicionamento.
§ 2º A opção a que se refere o “caput” alcançará todos os estabelecimentos do contribuinte localizados no território nacional e será consignada no Livro de Registro de Utilização de Documentos e Termos de Ocorrências de todos os estabelecimentos do mesmo titular, observado o seguinte:
I - a opção será anual, irretratável para todo o ano-calendário, e deverá ser registrada até o último dia de dezembro para vigorar a partir de janeiro do ano subsequente;
II - na hipótese da abertura do segundo estabelecimento do mesmo titular, a opção deverá ser feita no prazo de até 30 (trinta) dias da data da abertura constante no cadastro de contribuintes;
III – feita a opção de que trata esta cláusula, a renovação será automática a cada ano até que se consigne, no prazo previsto no inciso I, opção diversa.
§ 3ºA utilização da sistemática prevista nesta cláusula não implica no cancelamento ou modificação dos benefícios fiscais concedidos pela unidade federada de origem e destino.
§ 4º Feita a opção prevista no “caput”, a NF-e que acobertar o trânsito da mercadoria, deverá constar, além dos demais requisitos exigidos na legislação, no campo “Informações Complementares”, a expressão “transferência de mercadoria equiparada a uma operação tributada, nos termos do § 5º do art. 12 da Lei Complementar nº 87/96 e da cláusula sexta do Convênio ICMS nº 109/24” (grifo nosso)
Com isso, conforme a previsão do Convênio ICMS nº 109/2024, os contribuintes que não quiserem aplicar a não incidência do ICMS em suas operações de transferências interestaduais de mercadorias entre estabelecimentos da mesma empresa, poderão optar pela tributação na operação.
Regulamentação dos Estados
Feita a edição do Convênio ICMS nº 109/2024, coube aos estados editarem a regulamentação das previsões neste contidas, o que ocorreu no Estado do Rio Grande do Sul por meio do Decreto nº 57.886/2024[2], publicado no Diário Oficial do Estado do dia 04 de dezembro de 2024.
Em sua redação, referido decreto ampliou a previsão prevista no convênio em questão, aplicando a não incidência do ICMS a todas as operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma empresa, com redação assim definida:
§2º Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas remessas interestaduais, hipótese em que os créditos serão assegurados por meio de transferência, nos termos dos arts. 35-A a 35-D. (grifo nosso)
A possibilidade de os contribuintes optarem pelo sistema de tributação do ICMS, nas operações de transferências de mercadorias entre estabelecimentos da mesma empresa, foi replicada no Decreto em comento. Inclusive para as operações internas! Para tanto, a data limite de opção, para efeitos no ano de 2024, foi mantida em 30 de novembro de 2024, anterior à data de sua publicação (04/12/2024).
Diferimento do ICMS – Operações internas no RS
As operações de transferência dentro do Estado, de mercadorias entre estabelecimentos da mesma empresa, bem como, todas as demais operações diferidas previstas no Livro I, artigo 53 e Livro III, artigo 1º e suas ramificações, ambos do Regulamento do ICMS do Rio Grande do Sul – Decreto nº 37.699/97, estavam até então submetidas ao diferimento do ICMS.
Contudo, o Estado do Rio Grande do Sul publicou no Diário Oficial do Estado do dia 27 de dezembro de 2024 (período de recesso da maior parte das empresas), o Decreto nº 57.931/2024[3], no qual, regra geral, condicionou aos contribuintes gaúchos, que aqueles que no ano de 2025 queiram manter a utilização do diferimento do ICMS deveriam realizar a opção prevista no Decreto nº 57.886/2024 até o último dia do mês de dezembro de 2024.
No tocante ao diferimento do ICMS, frisa-se, todas as previsões de diferimento que estão abrangidas pela nova sistemática, inclusive as que reduzem o ônus tributário das operações de 17% para 12%, denominadas de “diferimento parcial”. Ou seja, a partir de 1º de abril de 2025, só poderá usufruir do diferimento o contribuinte que tiver feito a opção mencionada acima.
Se a intenção do Estado era essa, porque não editou tal texto legal juntamente ou em dia subsequente ao que regulamentou a redação do Convênio ICMS nº 109/2024? Fazer tal publicação no penúltimo dia útil do ano, em que a maioria dos contribuintes se encontrava em recesso, demonstra, com o devido respeito, ou desorganização no ordenamento tributário ou má fé na intenção de aumentar forçosamente a arrecadação no ano de 2025.
Considerando que as regras disciplinadas no Decreto nº 57.931/2024 passam a vigorar apenas em 1º de abril de 2025, é necessário que o Estado reveja o prazo estipulado para a referida opção de equiparação de suas operações de transferência àquelas sujeitas à ocorrência do fato gerador, estendendo a data limite de adesão até a data na qual irá vigorar tal regra.
ACI informa aos seus associados que adotará as medidas legais cabíveis.
Cauê Cardoso Soares - Advogado
Consultor fiscal e tributário da ACI-NH/CB/EV/DI
Buffon & Furlan Advogados Associados
[1] https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/2024/CV109_24
[2] http://www.legislacao.sefaz.rs.gov.br/Site/Document.aspx?inpKey=297280&inpCodDispositive=&inpDsKeywords=
[3] http://www.legislacao.sefaz.rs.gov.br/Site/Document.aspx?inpKey=297351&inpCodDispositive=&inpDsKeywords=